Gestores reduzem exposição a risco – Valor 4 de abril de 2019

O clima de nervosismo que se instaurou no campo político no fim de março forçou uma correção no preço dos ativos financeiros e levou os investidores a ajustarem suas posições. Embora o mercado continue otimista com as perspectivas para a aprovação da reforma da Previdência, as incertezas sobre o ritmo da tramitação e a possibilidade de aprovação de um projeto mais desidratado exigem uma dose reforçada de cautela contra momentos de volatilidade.

Até então, era grande o otimismo com o processo de tramitação da reforma da Previdência, o que fez com que muitos gestores montassem apostas significativas para se beneficiar deste cenário. O que deflagrou o ajuste de expectativa, num movimento de maior cautela, foram os episódios envolvendo a troca de farpas entre o presidente Jair Bolsonaro e Rodrigo Maia, que comanda a Câmara dos Deputados.

O elevado nível de ruído colocou dúvidas sobre a capacidade de articulação do governo para aprovar a reforma, e analistas já esperam demora maior para o avanço da agenda — leitura reforçada ontem com a tumultuada sessão com o ministro da Economia, Paulo Guedes, na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.

A Porto Seguro Investimentos, por exemplo, agora trabalha com a aprovação da reforma na Câmara em setembro ou outubro, e não mais em agosto. “Quanto maior o tempo de tramitação, mais diluída tende a ser a proposta original, à medida que vai se erodindo, mesmo que lentamente, o capital político do novo incumbente e seu poder de influência sobre o Congresso, ainda mais em temas tão complexos do ponto de vista político”, afirma o economista-chefe, José Pena, em análise. Assim, o especialista trabalha agora com uma economia fiscal bem menor, entre R$ 600 bilhões a R$ 650 bilhões em dez anos, e não mais de cerca de R$ 750 bilhões a R$ 800 bilhões.

Para fazer frente às incertezas, a Claritas reduziu nas últimas semanas a exposição a ativos brasileiros e fez operações de proteção para cenários alternativos que possam ter suas probabilidades aumentadas, diz Damont Carvalho, diretor da área macro. “O cenário de médio prazo segue favorável para alocação em Brasil, mas estamos em período de negociação política e passagem pelas comissões no Congresso, o que gera ruído, volatilidade e enseja maior dinamicidade nas posições do portfólio.”

A Truxt reduziu a exposição ao risco em seu portfólio com o intuito de adequar a carteira a um cenário mais volátil e com as incertezas que envolvem a aprovação da reforma, segundo o sócio-fundador José Tovar. Agora, carrega uma pequena posição em juros, num ajuste adotado após notícias sobre a reforma dos militares. “Isso fez com que não sofrêssemos na piora que houve no fim de março.” Em paralelo, a casa segue apostando em ativos globais, como posições em bolsas e moedas emergentes.

Há quem tenha se antecipado e assumido posição mais defensiva no fim de fevereiro e começo de março. A Novus Capital reduziu a alocação ao risco na primeira quinzena de março e, com a realização de lucros no fim do mês, aproveitou para retomar uma alocação “moderada” em bolsa, conta Luiz Eduardo Portella, sócio e gestor da instituição.

Durante o momento de nervosismo, a Novus também viu oportunidade para montar posição vendida em dólar (que ganha na queda da moeda) contra o real, algo que não acontecia desde fevereiro. Sob expectativa de aprovação da reforma, a casa tem posição favorável a ativos locais, sobretudo na bolsa, além de uma estratégia de opções para queda de juros ao longo do segundo semestre.

A Ibiuna, prevendo grandes oscilações, ajustou a carteira para uma exposição média menor do que o observado no primeiro trimestre, mas continua aplicada em juros nominais de médio prazo e no Ibovespa. “Nossa leitura é a de que teremos um período de volatilidade relevante nos próximos três meses, o qual demanda maiores prêmios de risco nos ativos brasileiros”, diz a casa em relatório.

A baixa visibilidade em torno da reforma da Previdência tende a limitar o potencial de ganhos dos ativos locais no curto prazo, trazendo uma dose reforçada de volatilidade. Um ponto importante de resistência no mercado, na avaliação de Oscar Camargo, sóciofundador da GAP, é de 105 mil pontos na Ibovespa. Já a queda do dólar pode ser limitada à marca de R$ 3,70 e o juro longo do DI janeiro de 2023, a 7,80%. “Avaliamos que a reforma mais branda dos militares e as idas e vindas no campo da articulação política fortaleceram a tese de uma reforma diluída (cerca de 70% da proposta original) e mais demorada”, diz.

Camargo explica que, após a frustração com a reforma dos militares, zerou as posições em ativos locais e comprou inflação implícita, que serve como proteção contra aumento da inflação. Em seguida, com a desvalorização dos principais ativos brasileiros, a operação foi desmontada e a casa buscou estruturas de opções no real para se beneficiar da redução dos prêmios de risco, algo que continua carregando junto com posição aplicada em juros reais.

Para Vitor Carvalho, sócio e gestor da Laic, o Ibovespa deve enfrentar resistência na região de 98 mil a 100 mil pontos, enquanto a queda do juro longo do DI para janeiro de 2027 tende a esbarrar na marca de 8,90% e o dólar, em R$ 3,80. A estratégia na Laic foi reduzir a alocação em renda variável e buscar proteção via opções de venda de Ibovespa e compra de dólar. “A aprovação de uma reforma com poupança pior do que R$ 600 bilhões em dez anos, ou mesmo de não aprovação, deixou de ser risco de cauda”, alerta o profissional. Isso significa que esse cenário, de elevado potencial de impacto no mercado, já não tem probabilidade tão baixa.

A instabilidade dos ativos, com queda de preços, também abre oportunidades de alocação. “Aumentamos posição [em ativos locais], pois achamos que as questões eram ruídos e não mudança de cenário”, diz Dan Kawa, diretor de investimentos na TAG, que mantém a expectativa de economia, com a reforma, na ordem de R$ 650 bilhões a R$ 750 bilhões em dez anos.

Para enfrentar a volatilidade daqui para frente, Fernando Lovisotto, sócio da Vinci Partners, explica que seu fundo de ações aumentou o total de capital não comprometido de 0,1% para 7% . “Algumas oportunidades vão aparecer e esse caixa serve para isso.”